Sinto-me um miserável quando apaixonado. Ontem mesmo, sem
reparar no absurdo que escrevia por seu possível amor, comparei-me aos bichos
mais peçonhentos que habitam a superfície da Terra.
sexta-feira, 27 de janeiro de 2012
domingo, 22 de janeiro de 2012
O que eu mais tenho medo nessa vida
Não tenho medo de aranhas, sapos, cobras, baratas,
percevejos...
estes eu mato com chinelo ou veneno.
O que eu tenho mais medo nessa vida,
é que você apareça do nada,
e eu o confunda
com a imagem distante
dos olhos-castanhos-de-papel-kraft
suprimindo-me sem piedade
com sua beleza.
A rotina dos amantes
Despertei novamente com o ruído de uma maçã sendo mordida.
Agora já não me é mais novidade estes seus pequenos ruídos que ocupam o
apartamento pela manhã. É como o tráfego de carros, a sirene da polícia, o
choro intolerável da criança do vizinho, o salto alto da moradora do andar de
cima.
Incrível que agora me incomode com estas coisas tão pequenas
e comuns. Eu que a princípio maravilhei-me de dividir minha intimidade contigo;
de sentir-me seguro sabendo que os espaços estavam sendo preenchidos com suas
roupas, sapatos e outras coisas de homem.
Até a coisa mais ridícula...
(como direi isso sem ruborizar?)
Até a coisa mais ridícula, como lavar as minhas cuecas com
as suas, e depois vará-las aos pares, (tamanho P e M), causava-me uma alegria
tão distinta que só os casados entendem. Mas do nada não era mais distinto, era
cotidiano, e dividir as escovas tornou-se intolerável. Aí não quis mais ser
feliz, quis a alegria eufórica e confusa. Quis o desejo de nem saber o que
desejava. Quis a deriva de outras línguas, de outros pensamentos na arrebentação
das ondas.
- A arrebentação das ondas nas pedras, é a coisa mais
linda de se ver!
-Sim, não há nada parecido!
-Nem nosso amor é tão belo quanto a arrebentação das
ondas.
-Bobagem!
Foi quando ele arrumou suas coisas e não voltou mais.
sábado, 21 de janeiro de 2012
Despertei com o ruído de uma maçã sendo mordida.
Ainda se fossem ovos estalando na frigideira, mesclados a
cantoria de alguém que eu levei para casa ontem, não acharia estranho. Eu me
levantaria e me depararia com a mesa de café da manhã posta, com flores do campo
no arranjo matinal, e não veria outra saída a não ser viver a sua conquista, desejando
que fosse para sempre o amor ainda vindouro.
Mas eu despertei ao som da deglutição da maçã. Consegui imaginar
até o modo como apoiava os cotovelos na mesa, enquanto uma das mãos segurava a
cabeça descaída, e a outra, levava a maçã aos lábios, depois aos dentes, a língua,
e na língua me jogava de um lado para o outro até que pensasse ser o suficiente
para me engolir. Vi até como sentado na banqueta, mantinha as pernas abertas, (trejeitos
masculinos), num azul-samba-canção desarrochado.
É quase como despertar com o silêncio e não saber o que
fazer dele, não saber nem porque despertou se a vida parecia estagnada. Achei de uma delicadeza próxima do absurdo
ouvir tão claramente um som quase inaudível. Exatamente igual quando me abraça
por trás, respira no meu pescoço, e penso ser o vento invadindo a casa por
entre as frestas da porta de entrada, no entanto é apenas você se fazendo audível.
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