sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Porque me ler - Parte I


I



Porque me ler. Não, vou criar outro título, este não me tem inspirado a desenvolver idéias. Que tal, Por que as pessoas morrem de câncer? Não, piegas demais. Talvez intitule de “Poética”, contudo isso não é poema mesmo que beire a abstração. Na verdade é mais um “porquê de escrever”.

Como aquele meu personagem de cabeleira ruiva, ainda sem nome, que mesmo não compreendendo como as palavras se engendram num livro, vai à biblioteca pública de sua cidade, senta-se, folheia do clássico ao contemporâneo, no entanto são apenas possibilidades, pois que ele só entende quando se depara com a palavra respirar, então numa cadência quase inaudível infla seus pulmões ao limite e então exala aliviado sabendo que de tudo o que lera, algo lhe havia entranhado como fumaça de cigarro e daquele cheiro não esqueceria.

Esse ruivinho ainda carrega as dores do mundo. Um idiota. Quer porque quer saber o que é câncer. Pena que ele não me pode ler, senão lhe diria que é inútil conhecer, é como tentar saber o que é a fome quando se tem a disposição guloseimas na dispensa, ou então, passar um fato como verdadeiro ao próximo só porque leu em algum livro que o homem foi à lua; tornando a idéia um pouco mais acessível, a história do mundo ou do seu vizinho é indiferente, ela nunca existiu. Não nos interessa. O que nos interessa é unicamente o que nos faz ser como somos: é o subjetivo. Ou agora você vai insistir em me convencer que presencia velórios alheios?

Têm coisa melhor que se dar ao luxo vez ou outra? O ruivinho às vezes vai à feira e compra bandejinhas de figos e sente deliciosa cócegas na língua quando a aspereza do mesmo lhe toca. Então morde, mastiga e engole satisfeito, toma um bom chocolate quente e se deita para não pensar em nada, o que expressa uma enorme vontade de viver, de sair do mundo emprestado dos outros e de criar sua própria história.


Já sonhou em ser policial ou mesmo médico, pois assim estaria sendo o herói de alguém, mas já lhe disse: as pessoas que se salvem sozinhas, idiota! Come seu figo e faça o seu.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Os vaticínios da velha Bruxa



Subjeções

Parei abismado:
era a última vez que me veria com

18 anos.

Será que é agora que começo a desenhar no escuro?
ou, definitivamente esqueço toda essa metalinguagem
em têmpera e parto para o salto?

Que salto?

São numerosas as possibilidades de combinações,
de transistores, fios e cabos de fibra óptica...
Onde estava mesmo?
Será que falar de tecnologia é se tornar um pouco velho?

Sinto, e sentir é fato.
Fato é uma cela do envelhecimento
– é o vaticínio da bruxa.



Vaticinações.

1. Queimei-me as pontas dos dedos.
2. Há em mim um desejo libertador de me prender,
de me aceder como se faz a um cigarro
e de ser fumado pelo mais débil cafajeste.
3. Cigarros me excitam.
4. Incenso é fumaça.
5. A contraposição.
6. A dúvida.
7. A simplificação.
8. As inúmeras possibilidades de combinações.
9. Na numerologia, o mais extenso número se converge,
pela soma ou subtração, na primeira dezena.
0. O eterno retorno.

Subjeções

Carrego isto com minhas alegorias
de que nada dizem.
È um carnaval antecipado.
Abre-alas de um tema possivelmente já contado.

(oh, às vezes me detesto!)

Mas, quando parei de frente ao espelho
e me vendo pela última vez assim
reparando as feições,
as expressões de um rosto incompleto de barba nas maçãs do rosto;
do ralo azulado de bigode...
tive um choque, um vaticínio:

(oh, às vezes a bruxa em mim me detesta!)

o aqui-e-agora transfigurava-se no que já havia sido
e ao mesmo tempo preconizava um depois que agora já era imediato, pois
que o muito além não existe.

(oh, às vezes eu detesto a bruxa que está em mim!)

Desculpem-me os que prezam pela jovialidade mental
mas acredito na construção do tempo,
de como o tic antecede o tac
seguindo um ao outro numa sucessão perpétua,
e nisto avisto o compromisso de ter de me tornar velho,
um pouco encarquilhado para a direita
com a pele quebradiça e as bolsas dos olhos
caiadas e volumosas.

oh, às vezes a Bruxa me controla!

Vaticinações

Se me fosse pedido que me apresentasse,
trajaria meus trapos e subiria numa vassoura
para flutuar ao lado da sua janela lhe narrando
o meu conchavo com o Demônio;
do pacto firmado ainda jovem.

(oh, às vezes eu detesto ser a Bruxa dele!)

Às vezes eu detesto ter que ser sua médium,
de ter que lhe transcrever em versos...
Agora mesmo, em sua prepotência,
me sorri disfarçadamente, pois sentiu estar no ápice do poema
quando construiu imagens que tiquetaqueiam
sobre olhos volumosos enquanto sua pele quebradiça
lhe avisa que está ficando velho.
Não,
Eu é quem decido qual é o ápice do poema
e isto termina aqui:

se cerro as cortinas,
é porque não há mais nada a ser apresentado.


Epigrama nº4
Pós subjeções e vaticinações


Não recordo exatamente do meu passado,
ele é inexistente.
E tudo que sei é que nunca
fui senão isso que meu espelho mostra.
Tal qual um vilão
utilizando o tempo como maquiador que
põe finas camadas de mágoas homeopáticas
e ao se mirar, o seu reflexo é um estranho
e você nunca mais será o mesmo.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Um fusca 88 ou qualquer coisa de quatro rodas

Escreverei qualquer coisa agora, como narrar a passagem de um fusca 88 vermelho pela minha rua ao mesmo tempo em que escrevo isto; isto que pode ser qualquer coisa mesmo, porém com uma condição: que você me leia.

Sei pelo barulho que era um fusca 88 e vermelho porque é do meu vizinho - não se preocupem, o escritor aqui não passou a ter epifanias depois que começou isto – ele sempre sai esse horário para buscar sua mulher no trabalho, diria que vivem felizes, possuem um casal de filhos - por um minuto pensei em mentir e dizer que eram de gêmeos, não, me recuso, hoje só o que pode ser verídico é que vou contar.

Meu vizinho também reúne seus amigos nos sábados à noite para comerem aquele belo bife sangrento com a cervejinha nossa de cada dia, gargalham alto, tal como conversam. Aliás, por que estou falando deles? Ah, ok (revelações) o autor disto é pré-intencionado e se desvenda perante o leitor – não sabia como começar!

E lá vamos nós nessa busca do “qualquer coisa”, como diria Fernanda Young em seus romances “ande logo com essa punheta, homem”. Tá, calma, é que as palavras às vezes me são débeis e se escapolem e quando isso acontece o que posso fazer é falar de outra coisa que não da idéia principal do texto; é nesse ponto que invadem esses vizinhos na minha retórica e tomam seus lugares de abre-alas, como agora: alguém bate na minha porta – com licença caro leitor, um minutinho...

... me desculpe, é que sabe como é vida em sociedade, temos que ser maleáveis, nunca sabemos quando vamos precisar –.

Deitei ontem lá pelas onze da noite com uma doída vontade de chorar. Sabe quando seus pulmões receiam a entrada do ar? Pois então, foi assim, não queria sequer o mínimo átomo de oxigênio, tinha medo, estava escuro e Tchaikowsy tocava como plano de fundo para um possível fim trágico, estava certo de que morreria ontem mesmo.

Pronto, a idéia voltou (epifania). È que ao invés de me tornar forte, dia a dia me debilito mais e minha maturidade encerra na de uma criança de 5 anos prestes a largar tudo, sim, desistiria de tudo ontem e hoje também, romperia com essas amizades estranhas, com os laços afetivos e me jogaria mundo além para morrer como um aborígine, o qual quando surge a oportunidade da morte lança-se na floresta, pois já não pode prover mais os frutos que sua comunidade necessita, e isso não é nem um pouco indigente, é apenas cultural.

Ah, me desculpe novamente, estou aqui me lamentando, espere. Ouça. É o vizinho e seu fusca 88 vermelho e sua mulher depois de mais um dia de trabalho. Na certa, queria entender como levar uma vida assim tão rotineira, talvez um pouco mais leve e menos ácida como a que tenho levado. (interjeição) Sim, saquei (nada é por acaso), o que me falta é um fusca 88 vermelho e uma boa mulher de quadris largos para me dar alguns belos filhos? (interjeição) Confesso, tenho inveja de tudo isso, me empresta?

domingo, 4 de janeiro de 2009

Ensaio Inconsciente: a Loucura

Há um quê de loucura em falar sobre a loucura, um quê de “estou beirando, mas não vou cair”, ouvem-se então, ecos de possíveis pequenas loucuras arremessando-se de desfiladeiros.

O meu problema não é essencialmente a loucura, é mais uma base abstrata de strip teases sendo feitos para alguém sentado naquela poltrona, você vê? Ele é tão lindo, ele sorri para mim como um príncipe. Danço para ele, tiro a roupa, ou melhor, rasgo, porque quando se tem paixão, as coisas são mais intensas, feitas para um consumo fugaz e imediato que talvez perdure apenas o instante de um orgasmo, no entanto carrega em si a promessa da realização plena.

E ele esta mordendo o canto da boca e eu continuo nu. Jogo-me para cima dele com um tesão irrefreável e suspiro em seus ouvidos palavras que o excitam a ponto de eu poder sentir toda sua potência máscula pulsando. Eu, eu desfaleço em seus braços, amoleço em seu corpo e me deixo ser escravo e usado como produto promocional que ao ser avistado causa repentina necessidade de ser consumido.

Coloco Álvaro de Campos na jogada, falo do engenheiro civil bicha de Pessoa, sem intenções de intelectualizar isto, pelo contrário, torno ainda mais vulgar e repulsivo.

(Pulo)

Estamos em alto mar, Álvaro em sua compulsiva vontade, deita-se nos porões com seus inúmeros marinheiros...

(Pulo)

Certamente que me fragmento como quebra-cabeça: alguém me emenda?

(Pulo)

... e Álvaro já foi meu puto, meu homem, meu parceiro inconfesso: minha bicha enrustida.

(Pulo)

Retorno e já nem sei de que retorno falo. Pego-me lendo qualquer coisa; o dia a dia é um dissabor. Então, acumulo na estante recortes e cortes e recortes, sobreponho imagens e textos. Pulo. Retorno. Faço sexo, pois que não há realidade suportável sem doses de loucura.

(Pulo)

Eiah Ho, Ho, Ho
Ho, Ho, Ho, Ho.

(Suspiro)

Estou beirando, talvez eu já caí.