sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Uma nova palavra toma meu mundo


Minha voz não é das melhores, mas o que vale é a intenção

Sicromalíaco.
Não sei o que realmente significa,
mas sei,
e isso é como dogma,
que é alguma coisa trespassada de ausência;
um neologismo incompleto que na falta de referência
referencia-se a qualquer coisa,
a qualquer si mesmo,
uma busca inteligível
uma palavra muda que na não expressão
encerra imagens que se vá,
que se vá na fruição do pigmento desprendendo-se da madeira
que se vá como sinal de fax
e que no retorno continue sendo qualquer coisa
que na pronuncia suscite dúvidas, inconstâncias
e um punhado de pó de pólvora no clichê do
rastro de possível explosão.
Que depois se assente
e se recolha no silêncio da pós-possível-explosão
e que não sonhe mais, fazendo-se também cega,
incauta, incognoscível, mas não mais misteriosa.

Epigrama Sicromalíaco

Crio
a tênue capa que cabe melhor
às idéias que nem no sonho encontro.
Trajo-as porque assim ficam mais apresentáveis.
Um palco, uma tenda, um frasco de essência,
A palavra existe por si só
e se manifesta para se livrar da imagem,
porque esta, tem-na sufocado.


Não entenda, apenas
absorva.
Deixe que se esvaeça qualquer
traço, e o que é livre verterá do livro
e quando sentir,
estará mergulhado como Alice
numa poça de tinta.
Nade nela, pois o que é sábio e vivo
você encontrará lá.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

O Mito do Amor Romântico

Perdoe-me por minha ansiedade;
por essa insegurança que perdura
no gesto em falsete ou na euforia gaga da fala.
Mas é que estou tentando conquistá-lo;
estou tentando me fazer necessário e indispensável na sua vida.
Perdoe-me, não me cansarei de pedir desculpas
mesmo que isso rutile um tanto “ultra-romantismo anacrônico”,
ainda assim, não deixarei que seu tato se recrudesça senão em minhas mãos,
pois, mesmo sem saber,
você já é meu.

Por isso me ame hoje,
ainda que doído,
ainda que estranho
ainda que impróprio,
descubra-me e depois me acoberte,
mas faça isso hoje,
agora,
neste instante, porque as
promessas para o amanhã já se fazem tardias.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Dry, Ansiedade A



A ansiedade amarrou minha boca.
Cortou meus lábios sem sangrá-los.
A ansiedade fumou meu último cigarro
e devorou os restos da minha geladeira,
bebeu do meu Dry Martini e comeu minha azeitona.
A ansiedade fez-me correr de pernas atadas.
Fez-me subir até o último andar do edifício
de vista vertiginosa, para depois me fazer descer.
Fez-me lavar as mãos
obstinadamente.
Fez-me ajoelhar diante de santos e demônios
como se eu acreditasse nessas coisas de imagens
sacras, sacrílegas, acrílicas, argila, Aleijadinho.
A ansiedade fechou minha porta
e enterrou as chaves no cimento fresco,
agora, já seco.
A ansiedade expulsou-me de mim mesmo,
pôs-me desabrigado...
abrigado nesse teto
de azul tempestuoso, que vez ou outra expõe
suas estrelas.


Estou exposto, fraco, deliberadamente mal,
meus joelhos doem, minhas mãos tremem
mais que de costume, e meus pés tropeçam;
Fui, dia desses, a Paris, New York e Bangladesh.
Meus pés tropeçam nas orelhas desse poema.
Também, dia desses, olhei para dentro da janela
e a mesa estava posta, composta, bosta.
Meus lábios tremem querendo romper
com a costura;
minha avó era costureira,
e eu aqui tentando alinhavar lembranças
sem nem ao menos usar dedais.
Estou fraco e minha coluna mantém-se tão rija
quanto uma estátua de mármore perdendo
suas partes para o tempo.


Estou caindo, caindo, cainn...
A ansiedade me empurrou vetorialmente
com direção, sem sentido, compridamente abaixo
num túnel escavado sobre a linha de terra.

Estou caindo, caindo e toca
obsessivamente uma música que conta
sobre fumaça de navios avistados de longe
furos de alfinetes,
uma certa agonia,
um grito putrefazendo-se no ar por vermes,
todavia,
sem mais dores e sofrimentos.

Algumas pedras me acompanham nessa descida.
Pedrinhas como aquelas que aparecem nos filmes
quando o mocinho está prestes a escorregar da beira do abismo,
e vem, obrigatoriamente alguém e lhe puxa pela mão.


Não, eu não sou o mocinho dessa história,
Quem sabe um banal figurante com trajes antigos,
Uma prostituta de milhares de políticos engomados;
Ou, mesmo, um sodomita em filmes para adultos.
talvez um serviçal que marca presença servindo xícaras
de chá para o patrão enquanto este:

-Oh, sim, tratemos disso mais adiante...

sou infelizmente dispensável.

Estou caindo
caindo
caindo

domingo, 26 de outubro de 2008

Ora Pois! ou A Literatura do Lunático


O realismo é tão frio. Sempre me neguei a registrar qualquer palavra que fizesse uma descrição objetiva e clara sobre os fatos, por isso escrevo. Nesse exato momento armo um palco com minha cia. De teatro, visto trajes nos figurantes e ponho nos meus protagonistas uma boa capa de mocinho ou de vilão, classificação esta a ser definida nos próximos atos.
O destino é um livro para cegos, você só entende se o tocar, mas, é fato que as linhas que o destino traça, são grossas e rudes com as mãos de qualquer mocinho ou vilão, pois cada qual possui antecedentes que justificam ou não suas atitudes. Tudo era um imenso talvez, pensava o Mocinho(vilão) nº 1, este que acabara de sair de um trabalho sobre levantamento urbano e já há algum tempo enfrentava a fila da cestinha.
Olhava para todos os lados como que procurando por algo interessante, algo que salte os olhos e se fixe como lente de contato até que chegue sua vez de passar suas compras no caixa. Então como um pedido que ascende ao céu e retorna como um raio a terra, entra em cena o Mocinho(Vilão) nº 2 sorrindo com sua amiga.
O problema é esse, o Mocinho número dois; eu não sei nada sobre ele, mas sei que quando o olhei e vi aquele sorriso e seus óculos, decidi olhá-lo mais, observá-lo de cima abaixo, mirá-lo e captar as mensagens que eram passadas por seu corpo, pela sua fala. E o carreguei em mim para fora do mercado.
Alguns dias depois...

Não, eu não estou apaixonado, ele é apenas um estranho e isso me lembra Closer, onde paixões ao acaso podem existir. Então sim, levando-se em consideração o cinema como um mundo paralelo, o Mocinho nº 1 vê-se apaixonado pelo Mocinho nº 2 e corre infrene para reencontrá-lo.

Mocinho nº 1 põe seu tênis.
Mocinho nº 2 põe seu tênis.
Mocinho n º1 sai de casa.
Mocinho nº 2 sai de casa.
Mocinho nº 1 dobra a esquina e se escora na entrada de uma loja.
Mocinho nº 2 dobra a mesma esquina e passa apressado enfiando o celular no bolso.
Mocinhos cruzam olhares.
Mocinho nº 1 cumprimenta.
Mocinho nº 2 retribui e passa.
Mocinho nº 1 pergunta se não o reconhece.
Mocinho nº2 afirma que reconhece e se desculpa porque está atrasado para pegar o ônibus.

- Arre! Podíamos ter trocado telefones, pensa mocinho nº1.

E os dias vêm se arrastando como nunca para o mocinho nº 1, com altas doses de poemas e chás que segundo a sua avó, que se considera curandeira, lhe receitou. E parece que exatamente agora, nessas últimas linhas que me restam e o desfecho que se inicia agora, inculca que se faça com versos de Cecília:

...

Meus sonhos viajam rumos tristes
e, no seu profundo universo,
tu, sem forma e sem nome, existes,
silencioso,obscuro, disperso.
...

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Socialização



Ontem, logo pela manhã, Tchaikovsky e sua Bela Adormecida vieram me visitar. Tomamos um chá com tortas de maçã que a Bela Adormecida trouxe. Foi uma delícia, são duas pessoas agradabilíssimas, educadas e de muito bom gosto, tal qual o meu amigo Iago, aliás, saudades dele. Se alguém o viu, favor lhe mandar lembranças minhas.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Você poderia fazer alguma coisa de vez em quando

Venho por meio deste esclarecer algumas situações pendentes. Críticas e proposições seguem abaixo:

Estou exausto de tanta espera que tua boca provinciana propõe. Essa sua paciência em resolver as coisas tem nos tirado inúmeras horas de prazer. Não quero mais essa contagem regressiva que nunca chega a um ponto de transição, as fronteiras se afastam e quanto mais risco os dias no meu calendário o tempo como agente relativo me vira como a uma ampulheta e quando vejo estou de volta com os ouvidos grudados ao telefone lhe ouvindo pedidos de desculpas e cobranças de compreensão.

Entender? Entender quando não há nada a se entender, é extenuar as forças e como já citei anteriormente, estou exausto, meu corpo já sintetizou todo o estoque de carboidratos; estou na reserva e não é nessa sua permanente ociosidade que reporei o que se exauriu.

Dito isto e na espera, como de costume, de resoluções, termino este.

Eu.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Agora Entendo



“Que a vida é maior que o fato
A força maior que o ato”
(Autor desconhecido)


O mundo urge, alguém já deve ter dito isso da mesma forma, no entanto é preciso começar isso por algum caminho que já foi trilhado para que seja de acesso para todos, ou não, pois isso é despretensioso de ser compreensível para o todo, dirijo-me a alguém em especial.

Abram-se os matagais à facões,
precisamos passar.
Necessitamos correr como forasteiros
por entre essas terras já batidas;
semear nosso grão de puberdade
e do chão fazer brotar pequenas revoluções
pois, que são essas que mudaram o mundo.
Mas o mundo urge, e urge porque tem fome
assim como nós temos por lhe desvendar.

A fome move o mundo, é a engrenagem propulsora de produção, o que Marx provavelmente em algum momento de sua enfadonha retórica deve ter citado, mas aqui é que são abertos os matagais e fixadas as placas de “passei por aqui”; é aqui que a vida se torna maior que o fato, e a força inevitavelmente maior que o ato.

sábado, 18 de outubro de 2008

A Infinita Mentira do Ser


IV – O Remorso do Eu


O mundo gira. Não foi preciso que mandassem foguetes carregados de gente para se certificar disso. Eu sabia muito bem que no momento em que se aproximou do outro Eu – primeira rotação – com intenções de revelar que o amava e não fazendo isso – segunda rotação – descobrira que perdera a chance de embarcar numa viagem rumo ao cosmo.

“Aproximei-me com tal zelo
mas com a palavra na boca
quase que sendo cuspida antes mesmo de
lançada.
Os instantes, e as figuras
átomos a átomos contrapunham-se na minha frente
e queria o outro Eu; queria amá-lo,
queria tê-lo como quem tem a uma poltrona barata.
No entanto, resta-me um disco de Edith Piaff,
toco-lhe e ouço alguém suavemente resvalar de sua boca
um ‘não me deixe só’
e eu reciprocamente lhe digo:
‘Nunca!’.”

V – O Retrocesso
Assim sofre Eu sem saber do que o outro Eu pensara dele quando o vira também. Talvez tivessem ambos amando um ao outro naquele instante, mesmo que por influência de Vênus e sua rebuscada beleza. Talvez tivessem se amando e isso seria maravilhoso, mas aí isso não seria um conto, seria Walt Disney e suas princesas branquinhas com lábios vermelhos esperando pelos seus príncipes com suas espadas soerguidas.

Desculpem por não saber o que aconteceu com o outro Eu no momento do encontro entre os dois, o que sei, são meras alusões de possíveis relações e o que eu posso dizer é: o mundo retrocede, e não é preciso que os foguetes voltem a Terra para nos assegurar da nossa infinita mentira do ser.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

A Infinita Mentira do Ser

III - Maleabilidade do Eu



Eu
sou apenas um portifólio de figuras abortadas
com pretensão de um dia a vir ser
qualquer coisa que
rasteje
trepe
desmorone;
qualquer coisa que
não invente prosa em verso.














terça-feira, 14 de outubro de 2008

A Infinita Mentira do Ser

I - Características Principais de Eu

Eu, esse é o nome do meu personagem. Poderia lhe nomear de João ou mesmo Maria, mas seria como travestir idéias quando na verdade só sei falar de Eu; Eu que é sempre o protagonista de tudo, que acorda às seis da manhã, mantendo seu trabalho e estudos quase sempre em dia.


Poderia aqui descrever fisicamente Eu, no entanto receio que lhe achem feio por ser magro ou excessivamente gordo; por não ter nascido com os olhos azuis ou verdes que tanto sua mãe pediu enquanto ele estava na barriga.



Eu
sobreposições
cascas
fardas
pele
tato
Eu

II - Estranhamente Narciso

Estranho o homem cotemporâneo, pensa Eu, morre de paixões por dentro mas precisa se mater inabalável e inconfesso para que o seu amor pense que ele não está em suas mãos.

Outro dia, Eu conheceu um outro Eu, bonito, com os olhos claros que tanto a mãe pediu que Deus lhe desse, e logo fall in love, ou melhor, se apaixonou. Eu viu no outro Eu o que nele não faltava e isso o deixava extremamente satisfeito, como aquela lenda de que Deus viu que a mulher era bom, e assim Deus a retirou da costela de Adão, ou ao contrário, lembra?

Eu se aproxima do outro Eu, e assim foi feito o sonho grego:

Eu
Te amo Eu
Eu não pode saber
Eu consome-se
e precisa esconder

continua...

o oco cheio de vazio

é que não posso ser porque não me pertenço não sou de mim mesmo: nem o corpo ou a fala nem o membro, nem a língua   nem o próprio gozo apree...