quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Quero um problema com seu nome


O fim é mais desesperador que o próprio início. Ao mesmo tempo, a mente organiza-se para que haja um fim adequado para todas as histórias. Talvez eu mate um personagem, mesmo sabendo que não é desse jeito que se pode levar a vida com maturidade. Nem sempre os vilões morrem para satisfazer a necessidade careta dos mocinhos. Ah, que ninguém nesse mundo é tão ruim assim. Nem meu pai grosseiro é tão ruim assim, comprovei isso quando ele deu uma segunda chance de emprego ao seu funcionário, que foi demitido por justa causa por tê-lo roubado suas ferramentas. Ah, que nem meu pai é tão ruim assim. Mas você... você também não é tão ruim assim, e bem no fundo da racionalidade, acho explicações convincentes para as mais terríveis coisas que fez comigo, aí, vai ficando oculta de mim a sua imagem. E de repente, vejo-me absurdamente necessitado da sua inundação, da sua presença idiota não sabendo o que fazer para me agradar. Por fim as brigas, o sexo, e a fome desesperada por besteiras.

Escolho a lamentação, ainda que apavorado e recoberto de moralismos. Choro pelos cantos a tempestade alagadiça que tínhamos nos arrabaldes da pele. E quero seus bofetes no rosto. Depois a rosa como pedido de desculpas, porque nem você se aceita pintado de monstro. Quero um problema de verdade. Não pequenos e múltiplos problemas sem nome. Quero um problema com seu nome. Mistério que ainda não revelei. Quero um problema com seu nome ou a sua morte. E fazer valer as palavras do Seu Neruda à Matilde Urrutia. Para voltar a escrever mais poesias que tentativas de conto.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Objeto


Venho tentando dizer algo absurdo,
construir algo absurdo que cause estranhamento, 
mas que nem por isso te lance fora do meu círculo.

domingo, 4 de setembro de 2011

para entender o porquê te deixei quando te possuí por completo sem beijo de despedida


Uma amiga minha se escandalizou quando o comparei com um defunto enredado. Disse a ela que não era renda, era tule aquilo que lhe envolvia. A verdade é que para entender o porquê te deixei quando te possuí por completo sem beijo de despedida, eu preciso dá-lo como morto, como me foram dadas todas as pessoas que amei, embrulhadas num caixão com tule e crisântemos. Talvez ela nunca tenha perdido alguém para a morte, e no beijo de despedida tenha aspirado perfume, parafina e tule. A verdade é que tenho que ir até o nó do corpo do morto para te explicar isso. É que desde que perdi minha avó aos 12 anos, eu nunca mais beijei defunto, nem toco nas mãos persignadas sobre o peito, porque o frio do morto é de uma frigidez inóspita.
 
O caixão estava assentado sobre as tábuas apoiadas nas laterais da cova. O coveiro participando de tudo, mas alheio, apenas esperando a hora de submeter o corpo, depois ir embora. Trabalho é trabalho, só choro pelos meus. No mais, as tristezas carpideiras de sempre. Os familiares para darem seu último adeus. Eu também era parte da família, e hierarquicamente, os filhos foram derramar suas lágrimas. Depois os netos. Eu também era neto. Um por um se foram, com suas lágrimas e seus beijos. Quando chegou a minha vez não queria beijá-la por nada, primeiro pelo medo de me apoiar no caixão e resvalar nas ripas de madeira, e com elas cair também. Depois, as gotas dos que a beijaram reluziam ainda no seu rosto, juntando a isso, a sensação gélida que poderia me enjoar o estômago e vomitar sobre o corpo. Porque me julguei mesquinho, fui contra o que sentia, e pela primeira vez fui falso. Aproximei-me trêmulo, olhei para o rosto plácido dela, no qual os lábios apresentavam-se crispados, atochados para dentro das gengivas. Beijei a face dela. Misto de água, sal e frio inundaram minha boca, e como que engolido por tudo aquilo, não havia minhas lágrimas senão a dos outros, não havia dor senão o terror que desde então me consome quando falece alguém. Depois da minha avó, nunca mais beijei nenhum defunto, nem minhas duas outras tias que morreram posteriormente.

(Não beijarei meus pais?)

Por último, você me pediu um último beijo, e se soubesse dessa história, talvez lembrasse que não beijo defunto há anos, e que isto não é falta de amor ou orgulho ferido, é medo de cair dentro do seu poço mais escuro, e correr o risco de viver para sempre dentro daquilo que se findou.

o oco cheio de vazio

é que não posso ser porque não me pertenço não sou de mim mesmo: nem o corpo ou a fala nem o membro, nem a língua   nem o próprio gozo apree...