sexta-feira, 27 de setembro de 2013

romantismo anacrônico

Pensei em te agarrar pelas pernas,
ou segurá-lo pelos cabelos,
pelas mãos;
em por as minhas mãos sobre a tua cintura
e te cravar as unhas para não deixá-lo partir.
Mas recobrei a sensatez a tempo
fingindo modismos de compreensão.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

ZRO HRA

Por isso a demora no reconhecimento da face: a sua distância prolongada. Veio até mim e se foi como num rapto. 

A tua face igual, mas não reconhecível. Tentei recordar como te chamava antigamente, mas já me é impossível. Cruel esquecimento. E não é proposital, é que a vida me escapa.

A vida me escapa ou me prende de uma vez: um olhar distante tocando os muros de pedra enquanto mastigo como se não fosse sólido o que como e engulo. Não sei aproveitar o que me é dado, tampouco aproveito o que conquisto. 

Fiquei dias sem fumar, dias sem beber, dias de zero hora. As horas meditativas em que se sente cada vagaroso minuto e não se sente absolutamente nada. Chorei, dancei, ri! Falei nada, falei tudo, mas nada abrandou, nada arrefeceu!

Surge a ideia de fazer muito. Algo que ocupe todo o meu tempo, para que eu me sirva das horas. Ler? Escrever? Desenhar? Trabalhar? Aprender... vou me formar num verbo infinitivo, nada mais.

17/junho - a prece


Quanto trabalho,
A que todos nos dispomos
A enfrentar diariamente.
Corremos para todos os lados
Pedindo o descanso que não virá.

Virá?

Férias!
As aguardo como se pudesse
Transformar-me em outro.
Peço para ser outro esta noite antes de dormir,
E que tudo seja bem feito.
E que dê tempo.

Por quê?

Porque a alegria é tão grande,
e sentir apenas não basta,
que faz-se preciso dizer...

Nada me embrutece

O coração arrefecido?!!
Meu Deus, eu poderia por pontos de exclamação e interrogação infinitos... nunca chegaria a uma resposta. Quantas coisas cabem num milésimo de qualquer coisa? ...
Então algo desenozou minhas mágoas

(foi sua presença?),
com seu jeito complicado que entendi como singelo de me fazer simples.
Bom é ser simples.
E esquecer que toda a minha vida está contida nas ranhuras da unha do dedão do pé.
Toda a minha vida visível na superfície da unha.

(foi sua presença que me fez ver?)
Enquanto isto e aqui,
Nada mais me dói, nem me alegra.
Permaneço sereno,
Nada me embrutece.

as coisas alheias

Tanta mágoa e rancor coração! Adélia diria, que mal de chagas te comeu coração? Assim mesmo? Pergunto à Adélia?! Eu sei que depois de 30 anos de casamento, seu coração já repartido não reconhece outro caminho senão o caminho do amor que viveu, e agora lhe deixou. 

Você me diz:

- O meu controle,
vem do pulso firme da vontade dos outros.

Parece uma poetisa. Rio. Não porque não seja capaz de ser uma poetisa de peso, mas porque é burra, e só sabe falar poesia quando sofre. Mas queria você de volta, fazendo bolo enfeitado, vivendo sua vida, a sua família como antes. Fazia-me tão bem, o seu bolo repartido, dando de comer a nós todos, enquanto falávamos sobre coisas alheias.

Ai, as coisas alheias! Meu amor, volte a ser alheia conosco, volte a ser alheia como nós, com aquele seu cigarro e sua boca sempre aberta pronta pra mandar o rei tomar no cu.

de profundis II

Querem-me todos sem vaidades e com o amor comedido dos anjos, o que sinceramente não me interessa. Nunca tive a aptidão dos santos, nem o simbólico pão e vinho servidos no monastério. A minha mesa sempre foi farta: mel refringente à luz solar, mel escorrendo no canto dos lábios, mel a me molestar na textura dos abusos. Tenho gosto pelo que me molesta, pelo o que sem permissão me arromba e destrói. Depois me recompõe, peça por peça numa nova conformação, conferindo novo sentido ao que eu nunca soube direcionar, e provavelmente nunca saberei. Apenas uma farsa, pois estou sempre fora do racional, resolvendo a minha vida na urgência do sistema excretor. Ao vício hipocondríaco de manter-me num fluxo para evitar constipações. Às vezes tenho vontade de parar.

no tempo dos homens, no tempo de Deus

Pensei: quero viver no tempo de Deus! Então fiquei comovido e doído. Imaginei diversas situações para usar o pensamento tido, e o vi sentado no sofá chorando por um motivo alheio. Sentei ao seu lado e disse: tudo passa, não vivemos no tempo de Deus. Ele me olhou ainda encharcado, não respondeu. Continuou encharcado. O que eu queria mesmo era consolar, macerar a ferida dele com açúcar e afeto.

Era noite então, dormimos por nada.

Só no sonho pode-se viver no tempo de Deus, lá onde os segundos valem a idade da criação.

Entro na sala, e lá está você na mesma posição, rindo com as piadas do programa de televisão. Gosto tanto de vê-lo se divertindo... No tempo de Deus, só há tempo para se divertir! Ele fecha o sorriso, e volta sua atenção ao programa. Devo ser maluco por essas coisas! Ora querer viver no tempo de Deus, ser eterno e feliz; deve cansar ser feliz eternamente e estar consciente disso. Melhor é ser louco para viver no tempo de Deus.

                 II
Gosto do efêmero, o que Deus não entende, mas permite. O cigarro tragado em cinco minutos, a tapa e a sua ardência fugaz; só não é efêmero quando é no rosto e com intenção de machucar, como a tapa que você me deu dia desses num restaurante. Não sou tua puta. E a tapa ardeu no tempo de Deus, e agora vive no meu inconsciente latejando, servindo como pretexto para o meu choro fácil. 
Até minutos atrás, pulávamos as poças d’água e nos divertíamos com isso. Agora já é lembrança, e se recontada muitas vezes, perde-se a veracidade, porque ganha ares de ficção, e vira tudo mentira ou se dilui em cada palavra: as poças, um guarda-chuva, malas e o tempo de Deus.


                III
E o tempo de Deus é diferente do meu tempo? Pergunta de resposta tão óbvia. Se eu pergunto é porque realmente preciso entender isso, porque realmente dei com a testa nela, e ela não era permeável.

                               

o oco cheio de vazio

é que não posso ser porque não me pertenço não sou de mim mesmo: nem o corpo ou a fala nem o membro, nem a língua   nem o próprio gozo apree...